A Compaixão como Caminho de Libertação: Reflexões sobre a Realidade dos Pobres nas Periferias
Marcos Aurélio dos Santos
Os pobres, sobretudo os marginalizados que habitam as regiões periféricas dos centros urbanos, bem como as áreas rurais e ribeirinhas, vivem em um mundo à parte. A sociedade dominante os empurrou para espaços invisíveis, onde não possam se misturar com aqueles que se autodenominam pertencentes a uma "classe superior". Assim, os pobres foram levados a construir um mundo paralelo, com uma cultura própria, marcada pela luta cotidiana por sobrevivência em meio às investidas cruéis de um sistema capitalista que perpetua injustiças e desigualdades.
As famílias que vivem nas periferias enfrentam diariamente a batalha pela sobrevivência, recorrendo a arranjos precários para moradia, e a esforços imensos para garantir o mínimo necessário: alimento, medicamentos e outras necessidades básicas. Um exemplo concreto que ilustra essa realidade é o caso de Pedro e Francisca, casal desempregado com seis filhos, moradores da comunidade de Jardim Progresso, na zona Norte de Natal, no Rio Grande do Norte. Em uma tarde exaustiva, após mais um dia de trabalho árduo, Pedro compartilhou sua rotina. Como de costume, ele vendeu pipocas, balas e refrigerantes em seu carrinho, posicionado em frente a uma das maiores fábricas de tecido do país, localizada na BR-101, próxima à sua residência. Apesar do esforço, os ganhos obtidos são insuficientes para suprir as necessidades básicas da família, composta por oito pessoas.
Diante dessa realidade, é fundamental compreender que a verdadeira compaixão exige proximidade com os pobres. Esse conhecimento não pode se limitar a livros, palestras, estatísticas ou ações pontuais de assistência promovidas por grupos, ONGs ou instituições religiosas. A realidade dos pobres não se revela plenamente por meio de pesquisas acadêmicas ou trabalhos sociológicos. A compaixão, à luz do Evangelho, se manifesta em encontros concretos e comunitários, sustentados por uma perspectiva libertadora e por uma prática de amor efetiva aos pobres.
É importante reconhecer que, embora o tema da pobreza esteja presente em inúmeras pautas de igrejas, universidades, organizações sociais e seminários, frequentemente a chamada "opção pelos pobres" tem se resumido a discursos e estudos teóricos. Muitos ainda desconsideram a força e a criatividade dos pobres em suas próprias lutas por libertação, preferindo vê-los como uma classe inferior, eternamente dependente da caridade daqueles que possuem algo a oferecer para amenizar seu sofrimento.
Assim, não é exagero afirmar que falta compaixão genuína em nossa sociedade. Falta-nos o que sempre esteve presente na vida e no ensino de Jesus de Nazaré. Há uma profunda contradição em falar sobre os pobres a partir da tela de um computador, de um smartphone, de um escritório confortável ou de um púlpito, sem que exista, de fato, envolvimento pessoal e concreto com os que sofrem. É urgente desconstruir as barreiras que separam os mundos e nos dispormos a caminhar, sem medo nem preconceito, rumo à realidade daqueles que foram esquecidos por uma sociedade moldada pelo consumismo egoísta e pelo bem-estar individual — um mundo cada vez mais distante dos valores do Reino de Deus.
Jesus nos aponta para o caminho da compaixão. A verdadeira compaixão é voltada para as pessoas, não para coisas ou discursos vazios. Ela revela o amor de Deus pelos pobres e encoraja discípulos e discípulas a trilharem um caminho de encontros: encontros de partilha, afeto, solidariedade, celebração, abraços, consolo e palavras de ternura. Esse caminho transcende práticas religiosas, pois a compaixão não está subordinada a dogmas, códigos, ritos ou doutrinas. Ela é um ato livre, nascido do amor libertador de Jesus, que impulsiona os que escolheram seguir o caminho da esperança, inspirado pela vida subversiva do Nazareno.
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