Marcos Aurélio dos Santos
Falar de fé e política é falar da vida em sua plenitude.
Sem elas, a vida perde o sentido. Por isso, como sociedade que somos, se faz
necessário a prática do bem viver, para que todas e todos possam desfrutar de
maneira abundante de uma vida no Cristo politizado, que em sua caminhada
libertária anunciou as boas novas de alegria a partir da realidade do seu tempo
(Marcos. 1.14). No primeiro dos 10 mandamentos da relação sobre fé e política,
Frei Betto diz que a fé e a política contêm o mesmo oxigênio, mas não são a
mesma coisa.
Vejamos:
“Sem
respirar ninguém vive, pois necessitamos do oxigênio contido no ar. Também não
se pode viver sem beber água. A maior parte de nosso corpo é formada por água,
como no planeta Terra no qual habitamos. Como o ar, a água contém oxigênio. Ela
é uma mistura de dois gases: o oxigênio e o hidrogênio. Por isso é líquida e
não gasosa como o ar. Assim
são a Fé e a Política. As
duas contêm o mesmo “oxigênio”: o Espírito de Deus que tudo anima na direção do
Reino. E assim como as duas visam a libertar, também podem servir para dominar,
como a fé dos fariseus ou a política dos opressores. Fé e política não são a
mesma coisa. A fé é o oxigênio que o Senhor nos dá. Como diz o apóstolo Paulo,
por ela captamos a presença de Deus no qual “somos, existimos e nos movemos”.
Assim como o ar nos dá vida, a fé nos faz participantes da vida de Deus. Por
ela somos integrados à comunidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. A
política é uma ferramenta de construção do Reino, diferente da fé. Ela tem algo
que não é próprio da fé: o “hidrogênio” das análises da realidade e das
estratégias de luta. ” (Fonte: leonardoboff.wordpress.com).
Em concordância com Frei Betto, a política deve estar a
serviço da vida. Jamais deve ser utilizada para benefício próprio, ou como
ferramenta de opressão para a manutenção dos poderes dominadores, também não
pode ser usada para fazer politicagem, como meio da realização do toma lá, dá
cá, ou perseguição aos seus opositores. Por isso, uma fé que não é politizada a
partir dos valores do Reino de Deus, em vez de se fazer concreta a cultura do
bem viver na vida das pessoas, torna-se uma prática danosa, resultando em
opressão, principalmente aos pobres. Deve prevalecer a vida em comunidade, que
é a prática política do comum para todas e todos. (Atos.2. 44).
Jesus de Nazaré denunciou a política opressora do seu
tempo. Por esta razão não se manteve distante do contexto da realidade
sócio-política da Palestina. Ao contrário, sua chagada marcada pela
simplicidade em Jerusalém, sua caminhada de libertação com os oprimidos e
excluídos a partir da Galileia, a denúncia de corrupção, exploração e alienação
no templo e sua resistência aos poderes do império foram fatos históricos e
concretos em sua missão libertadora. Por isso não se pode pensar em um Jesus
despolitizado, alienado em um contexto político de seu tempo. Como diz Frei
Betto sobre a missão de ser discípulos e discípulas, somos seguidores/as de um
preso político, condenado por dois poderes, o que lhe custou tortura,
assassinato e morte.
Como discípulos e discípulas de um preso político, que
lutou ao lado dos pobres por libertação (Lucas.4.18-19), segue a busca da
prática da cultura do bem viver. É um chamado para uma escuta comunitária.
Escutar Deus e ouvir os pobres. É uma luta nas trincheiras da utopia da vida, o
que nos faz acreditar que juntos podemos construir um mundo melhor e fraterno,
menos injusto e menos desigual. A fé e o combustível que abastece a vida dos
que decidiram caminhar ao lado dos esquecidos, dos que lutam por uma sociedade
igualitária, onde todos/as possam desfrutar da terra em partilha, da vida
abundante presenteada pelo Deus Javé. A política, realizada a partir de uma
ótica do Reino de Deus é ferramenta poderosa na luta contra os poderes
opressores do nosso tempo e companheira na defesa dos direitos.
Em tempos de desmonte dos direitos sociais, mentiras,
perseguição aos povos indígenas e quilombolas, de homofobia e feminicídio,
assassinatos de líderes camponeses, urge acolher, proteger, lutar, resistir,
amar. A cultura do bem viver é política, é comunidade, é partilha, é utópica.
Ela não caminha com o individualismo que tem suas bases no egoísmo, nem com os
que promovem a injustiça, mas caminha na busca da fraternidade, no cuidado com
a vida em suas diversas dimensões, na esperança por dias melhores. Que a
política seja um instrumento de justiça para a prática do bem viver, para que
possamos dizer, o reino de Deus está entre nós (Lucas. 17.21).
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