Marcos Aurélio dos Santos
Entre os
evangélicos há vários conceitos sobre o que é igreja. Alguns são absurdos e não
se alinham com o Evangelho. Há muita confusão na definição e significado do
termo, e muitos crentes aprenderam de forma errada o seu significado. Não vou
aqui usar termos técnicos ou uma pesquisa sobre a origem da palavra como de
costume, mas iremos tentar responder à luz do Evangelho de Jesus de Nazaré, que
sem sombra de dúvidas é a base para entendermos o que é igreja. Então, podemos
começar refletindo sobre o que a igreja não é.
Igreja não é um local com endereço fixo e estrutura
física. É comum entre os evangélicos dizer: “Hoje é domingo! Vamos à igreja!”;
ou “Onde está Maria?” – e respondemos: “Foi à igreja!”. Está em nossa cultura a
ideia de que igreja é o espaço com paredes e portas onde as pessoas se reúnem
para prestar culto, estudar a bíblia, orar e etc. Este conceito chega a ser
alienado, por não compreender a igreja como um organismo vivo, um povo em
movimento, que caminha com o Cristo. Não há como encontrar vida em em
estruturas ou objetos inanimados. Não pode haver movimento, entusiasmo,
dedicação e serviço entendendo a igreja de forma equivocada como um lugar de
encontros de domingo. É uma definição reducionista do que seria a igreja.
Igreja não é uma instituição. A instituição não foi
uma invenção de Deus, antes das instituições já havia a igreja de Jesus. Os
homens a criaram. Constantino, imperador Romano que governou entre os anos de
306 a 337 d.C., tornou o cristianismo religião oficial do Império. Desse
período em diante, a igreja cristã tornou-se uma instituição ligada ao estado
de Roma. Hoje há milhares de igrejas institucionalizadas no Brasil e no mundo;
umas tem prestado um bom serviço à igreja de Jesus, outras não. É ai que está a
diferença. As instituições têm sua importância para a igreja, foram criadas
para servir à igreja, especialmente no que se refere à organização e
legalização diante das leis do país. Contudo, quando estas se corrompem e se
aliam aos sistemas de dominação e opressão, passam a ser um desserviço para o
evangelho e para a igreja do Nazareno. Não são poucas as instituições que
lamentavelmente traíram o evangelho de Jesus se aliando ao sistema neoliberal-capitalista-religioso.
Igreja não é um templo. Quando falamos em
igreja-templo automaticamente devemos pensar em duas coisas: sagrado e profano.
Muitos evangélicos deixaram de ser igreja para serem adoradores do “templo
sagrado”. Nessa perspectiva, muitos têm se esforçado para investir e adorar o
“santo templo”, em detrimento do serviço de amor às pessoas. Investe-se rios de
dinheiro em construções de templos ociosos, poltronas de luxo e ar
condicionado, onde não se move um dedo para acolher o pobre; aliás, trazê-los
para dentro do templo é, muitas vezes, “profanação”, pois pobreza é sinal de
pecado, para muitos. Não é preciso fazer muito esforço nas leituras dos
Evangelhos para afirmar que Jesus nunca pediu um templo, muito menos uma
adoração ao mesmo. Jesus não era um fiel religioso frequentador do templo, as
pessoas sempre o encontravam entre os pobres, no meio do povo, entre os
excluídos. Raramente , quando estava no templo, fazia duras críticas ao sistema
opressor de sua época. Não partilhou das injustiças do templo, que vivia em
coluio com o Império de Roma. Jesus não profanou as Escrituras.
Igreja não é uma denominação. É natural também
entre os crentes perguntar: “de que igreja você é”? – e nós respondemos: “Sou
batista”; outro: “Sou presbiteriano”; outro: “Sou assembleiano”; etc. No Brasil
existem milhares de denominações, muitas delas, fruto de divisões causadas por
disputa de poder, divergências sobre doutrinas e outras questões semelhantes.
Lamentável. As denominações em geral têm ramificações diferentes, em sua
maioria plantadas por missionários vindos da Europa e dos EUA. Em sua maioria
as frentes missionárias trouxeram para o Brasil o chamado “Evangelho cultura”,
sem levar em conta a contextualização do evangelho de Jesus ante os problemas
reais de desigualdade e pobreza na América Latina – como também o foi no
Brasil. Também Foi o tempo do chamado “Evangelho colonizador”, que ainda
permeia as igrejas. Essa definição não se alinha com o evangelho, pois para a
maioria dos seus adeptos igreja é sinônimo de placa denominacional onde há uma
ênfase radical na valorização da doutrina, cultura importada, centralização e
ensinamentos dos fundadores e pensadores de cada denominação, em detrimento de
uma igreja comunitária e fraterna atuando juntas como corpo de Cristo no mundo.
Igreja não é uma empresa. Esta é mais uma das
distorções na definição do que é igreja. Para muitos, igreja é uma organização
que se reúne em nome de Cristo, que por meio da pregação e de rituais de
sacrifício consegue ser uma igreja próspera financeiramente, com gestão eficaz
e um bom sistema de organização de investimento financeiro, que alcançou o
sucesso, portanto é uma “igreja abençoada”. Quando seus membros estão
prosperando nas finanças, a igreja está bem estruturada, com boas reservas de
dinheiro em caixa; para estes, essa é a igreja de Jesus. Não é difícil perceber
na metodologia dessas “igrejas-empresa” a lógica de mercado empresarial. Metas,
valorização e venda dos produtos nas prateleiras do mercado religioso,
investimento em infra estrutura, palestras sobre motivação pessoal, culto dos
empresários e a barganha em nome de Deus. Isto não é igreja. Esse modelo
empresarial dentro da igreja de Jesus deve-se atribuir ao sistema
capitalista-neoliberal trazido pelas igrejas dos EUA, nos primeiros anos de
evangelismo no Brasil e tem seu ápice com a chegada das igrejas neopentecostais
na década de 80.
Ser Igreja nos basta. Igreja são pessoas que se
reúnem em torno de Cristo e o seguem como discípulos/as. É o povo de Deus reunido
em missão, É uma igreja que se move ao encontro do próximo, entranhada de
misericórdia e de amor fraterno. A igreja de Jesus não vive para si, mas para
os outros em comunidade; deve ser serva dos pobres, pois aquele que a comprou
com sangue precioso serviu até o fim. Ser igreja é ser do caminho trilhado por
Cristo: devemos caminhar com Jesus e com os que ele amou, ou seja, os pobres. A
igreja deve ser itinerante, se estamos confinados nos templos, não somos igreja
de Jesus. A igreja de Jesus é viva, verdeira e cheia de compaixão, não se dobra
diante da injustiça, é acolhedora, é inclusiva. Longe de ser uma instituição
organizacional, ou uma empresa no mercado capitalista, a igreja de Jesus deve
demonstrar o amor de Deus ao mundo, unidos em um só corpo, de maneira
ecumênica, para a glória de nosso Senhor Jesus Cristo.
Sobre o Autor: Marcos Aurélio é Teólogo e Ativista Social. É colunista do CEBI (Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos). Facilitador da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito em Natal, RN e coordenador do Espaço Comunitário Pé no Chão.
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